Começo por partilhar uma constatação feita no último programa dos Prós & Contras na RTP1 que achei muito oportuna. Quando uma mulher vai fazer uma ecografia para ver o seu filho/filha, a médica não diz “este é o seu embrião” ou “este é o seu feto”. Diz “este é o seu bebé” ou “este é o seu filho”.
Porque é que o nosso bebé passa a ser referido como “embrião”? Porque nos dá mais jeito? É uma tentativa de nos desresponsabilizarmos? É para que os alertas da nossa consciência amenizem? Porque soa mais fácil? Menos importante?
Várias vezes vejo utilizarem o argumento de que “mais vale” não nascer do que viver com fome, sem educação, sem um futuro. Pois então temos muitos abortos a fazer. Não só de 10 semanas, mas de 20, de 50 e de centenas de semanas. Podemos começar por África com todas as crianças que passam fome e às quais não se augura famoso destino. Parece que instituições como a AMI e Médicos Sem Fronteiras estão então enganadas. Talvez seja prudente que referendemos mundialmente se estas instituições fazem sentido existir. Se fará sentido existir quem procure dar conforto e saúde ao próximo e até, no meio da miséria e pobreza que tanto ignoramos, despontar um sorriso. Todas as crianças merecem a oportunidade de poder sorrir.
Muitas mulheres sentem-se indignadas por haver quem hipoteticamente duvide da sua capacidade de saber ponderar todos os prós e contras de levar determinada gravidez até ao fim. Muitas se sentem ofendidas por haver quem suponha que alguma mulher fosse capaz de fazer um aborto de ânimo leve.
Deixem-me que vos elucide sobre uma coisa. O ser humano é capaz de tudo. Há gente para tudo.
Se, como foi público, uma bebé de Moselos (Viseu) com 50 dias foi vítima de maus tratos e abusos sexuais pelos próprios pais, vou duvidar que não exista quem lhe dê na cabeça fazer um aborto só porque sim?
Se a menina de Figueira (Portimão) desapareceu e a PJ presume que a Joana tenha sido morta pelo tio e a mãe, esquartejada e dada aos porcos para comer, vou duvidar que não exista ninguém capaz de fazer um aborto só porque sim?
Este é o mundo em que vivemos. Há gente para tudo.
“Aqui mando eu!”. Recordam-se desta frase escrita numa barriga de mulher durante uma manifestação? Eu recordo-me e francamente dispensava recordar-me.
A barriga é da senhora, não temos dúvidas. Quer fazer um piercing, faça. Uma lipo-aspiração? Se isso a fizer sentir melhor, faça.
“Aqui mando eu... Decido quem vive e quem morre. Até me dão um prazo para o fazer. Tenho 10 semanas.” Chega a ser macabro.
Decidir? Não tem nada que decidir sobre o direito à vida de outro ser humano.
Ouvi noutro dia na TSF uma reportagem sobre pais (homens) que tinham optado pelo aborto (Sim, porque é preciso um pai e uma mãe). Um desses homens contou ter sido interceptado pela PJ no dia em que a sua esposa se dirigiu a um local para provocar o aborto.
Aqui não quero também deixar de dar nota que, segundo o entrevistado, a PJ depois de fazer seguir o caso a tribunal nunca mais se preocupou com a criança ou as condições em que ela cresceu, o que é uma falha grave do sistema e negligência completa.
Continuando, hoje aquele casal tem uma filha adulta. Criou-a. Cresceu. Provavelmente com muito sacrifício. Pergunto se valeu a pena? Não tenho o direito de o perguntar. Uma vida não vale ou deixa de valer a pena. Não nos cabe questionar ou valorizar uma vida.Uma vida é. Perguntem a essa mulher, não abortada, se valeu a pena.
Se um dia por má sorte me vir numa situação em que fosse preciso extremo sacrifício físico, monetário e psicológico para poder sustentar um filho que estivesse na barriga da minha mulher ou namorada, só me restaria procurar a força necessária para me superar e fazer da minha vida uma prova de amor para com a vida desse outro ser humano.
Só existe uma coisa tão valiosa como uma vida: outra vida. A única situação em que concebo efectuar-se um aborto é no caso da mãe correr sério risco de vida durante a gravidez ou o parto. Nessa situação sim, reservo à mãe a decisão.
Na minha cabeça tudo isto parece fazer sentido. Custa-me acreditar que se consiga ser indiferente à vida não a colocando acima de tudo. Mas a verdade é que cada um defende a sua opinião (voltando e não conseguindo deixar de voltar a insistir que, na minha opinião, não temos direito a opinião sobre a vida) com incondicional determinação. Parecemos formatados uns para o SIM outros para o NÃO e dessa divergência não conseguimos escapar.
O impossível é uma palavra que o Homem já provou diversas vezes ser transponível. Mas não estou a contar que todo o mundo se venha a “converter” a este ideal. Oxalá existissem as palavras certas para provocar o click necessário à humanidade. Cabe-me fazer o que não consigo evitar: insistir que o mundo pode ser um sítio melhor.